CONDUTORES DE CADÁVER


CONDUTORES DE CADÁVER


A história do Condutores de Cadáver é também um bom pedaço da história do punk (e do) rock brasileiro. Nos anos 70, o Brasil vivia em plena ditadura militar e a censura aos meios de comunicação estava no auge. Tudo era controlado pelo Estado, desde programas de rádio até o mercado fonográfico. Não existia MTV, sequer havia TV a cabo. O rádio FM era uma novidade, com menos de uma dezena de estações na cidade de São Paulo, a maior do país. Jornais e revistas eram rigidamente fiscalizados pelo governo. Até mesmo nas ruas não se andava livremente, pois a qualquer momento a polícia podia parar o cidadão e exigir que mostrasse seus documentos. Quem não portasse carteira de trabalho assinada podia se preso como suspeito de qualquer coisa. Apesar desse cenário, ou talvez, em virtude dele, na cidade de São Paulo, surgiram várias turmas de roqueiros. Note bem: turmas e não gangues. Eram grupos de “loucos”, como gostavam de ser chamados, que se reuniam aos finais de semana para ouvir som pesado e beber. Possivelmente, a única maneira de se informar sobre o as novidades roqueiras, trocar sons e ouvir o que não tocava no rádio e não passava na tevê. Bandas? Pouquíssimas. Primeiro porque equipamento era caro. O que era fabricado por aqui não tinha qualidade e a importação, além do preço proibitivo, era restrita devido à política econômica dos militares. Em segundo lugar, não havia locais onde tocar. Assim, os “loucos” preferiam mesmo o que chamavam de som de fita, reuniões normalmente realizadas em locais improvisados – algumas vezes em quintais cobertos de lona – e com o som no último volume. Em 1978, na zona norte de São Paulo, mais precisamente na Vila Santa Maria, uma dessas turmas, Os Ostrogodos, promovia um desses eventos, em que três amigos (Callegari, Hélio e Nelsinho Teco-Teco) que já tinham a idéia de formar uma banda, conheceram um cara ainda mais louco do que eles, que atendia pelo apelido de Índio, e resolveram formar uma banda. Surgia o NAI – Nós Acorrentado no Inferno, com Callegari na guitarra, Hélio no baixo, Nelsinho na bateria e Índio no vocal. Com essa formação a banda fez sua estréia, O show, em conjunto com o restos de Nada e o AI-5, outros pioneiros do punk brasileiro, aconteceu no Construção, um salão de baile que ficava na Vila Mazzei. O local era um dos poucos que tocava rock pesado e começava a abrir espaço para os punks. Mas a apresentação acabou sendo um desastre e eles resolveram mudar o nome da banda, com medo de que ninguém mais quisesse vê-los. Nascia então o Condutores de Cadáver, a banda mais punk de todos os tempos no Brasil. O “novo” grupo estreou em 79, já com Clemente no baixo, em um show na Gruta, este um salão exclusivamente punk. Quem presenciou pôde sentir a energia do grupo. O Condutores dava a impressão que poria abaixo não apenas o local onde tocava, mas toda a sociedade brasileira. Além de possuir um vocal agressivo ao extremo, no palco – e, algumas vezes fora dele também – Índio era perigoso, podia mesmo ferir quem se dispusesse a chegar muito perto. Provavelmente, ele foi o primeiro moicano brasileiro e, quando estreou o novo visual, ganhou de presente de Callegari uma machadinha, que o fazia lembrar um apache, ameaçando o público. Por trás dele, Callegari, Clemente e Nelsinho (depois, Marcelino) construíam uma parede sonora poderosa, com uma guitarra distorcida ao máximo e acordes básicos de três cordas. As letras convidavam a uma viagem por cemitérios em alta velocidade, acusavam a todos e recusavam tudo. Exatamente o que a molecada, já de saco cheio de ouvir rocks românticos e disco music, queria e precisava: punk rock visceral e autêntico. O Condutores seguiu seu caminho no inexistente mercado para bandas desse estilo. Por isso, os shows eram raros e a chance de gravar um disco praticamente nula. Paralelamente, em 1981, o punk brasileiro começava a ganhar forma e a crescer, ainda que muito modestamente em relação a países europeus e os EUA, que já viviam a “segunda onda”. Vislumbrando a chance de ocupar um espaço maior no emergente cenário punk paulistano, Clemente, influenciado pelo filme Rude Boys, do Clash, sugeriu novos rumos para a banda. Índio não aceitou, queria radicalizar ainda mais. No entanto, Callegari e Marcelino também queriam mudanças e o Condutores chegava ao fim. No lugar de Índio, entrou Maurício e o nome mudou para Inocentes. Começava outra página da história do punk (e do) rock brasileiro. Índio montou o Hino Mortal, que fazia um som hardcore, antes mesmo de existir o termo por aqui. Sem ter realizado qualquer registro em vinil, o Condutores tornou-se uma banda lendária e assim permaneceu por 20 anos. Em 2001, porém, começava o justo resgate de quem plantou sementes poderosas e viu outros colherem frutos. Convidados para fazer o show de encerramento do festival “A um passo do fim do mundo”, que reuniu mais de 50 bandas em São Paulo, em dois dias, o Condutores ressurgia das cinzas. Com três membros da formação original – Índio, Callegari e Hélio – mais o baterista Babão, a banda fez um show memorável. A boa recepção do público incentivou o Condutores a gravar um compacto com quatro músicas (Alta Velocidade, Choque-choque-choque, Cemitérios de Concreto e Bem-vindos ao Novo Mundo). Até então, os únicos registros do som deles eram fitas cassete piratas, com gravações caseiras e ao vivo, editadas por pequenos selos europeus. O disco é uma raridade, pois foram prensadas apenas 500 cópias. Bem-vindos de novo ao mundo Condutores! David Cintra (ou Strongos, editor do primeiro fanzine punk do Brasil, o Factor Zero)


FORMAÇÃO:


Índio-vocal

Callegari-guitarra

Héilo-baixo

Babão-bateria


ACESSE:


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